RIO- A adolescência é um período conturbado. Dúvidas sobre caminhos a seguir na vida adulta e outras questões pessoais ocupam a cabeça nessa fase da vida. Aos 18 anos, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) também vive suas crises existenciais. Desde sua criação, em 1998, a prova passou por diversas modificações mas, de acordo com especialistas, ainda tem caminhos a percorrer. Educadores indicam que a avaliação é uma ferramenta importante de promoção do acesso ao ensino superior, mas destacam que o modelo precisa se adequar melhor ao cotidiano dos candidatos e avaliar outras competências além do conteúdo das disciplinas. Nesse sentido, o Ministério da Educação (MEC) já deixou claro que do jeito que está, o Enem não vai ficar.
Em entrevista ao GLOBO há um mês, a
presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (Inep), Maria Inês Fini — responsável pela realização do Enem —,
criticou a configuração atual da prova que, segundo ela, se tornou uma
avaliação baseada em uma “lista de conteúdos”, assim como o vestibular
tradicional. Fini garantiu que à frente do Inep trará mudanças no formato do
Exame no futuro. Já a secretária-executiva do MEC, Maria Helena Guimarães,
afirmou que o ensino médio “virou cursinho preparatório para o Enem” e defendeu
adequação da prova à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), por exemplo.
A ideia de promover mudanças no modelo
da prova ganhou o apoio do presidente do Conselho Nacional de Secretários
Estaduais de Educação (Consed), Eduardo Deschamps. De acordo com ele, a falta
de um currículo para o ensino médio e a existência de uma avaliação como o Enem
padronizam essa etapa do ensino.
— Acreditamos que o Enem precisa passar
por uma avaliação de si próprio, uma reformulação. O Enem hoje acaba engessando
o ensino médio. Na ausência de um currículo, ele acaba servindo de referência.
Temos uma padronização por conta da prova, quando precisamos de um ensino médio
diversificado — analisa Deschamps, que critica ainda o fato de a prova servir
para funções distintas: — O exame acaba sendo usado como avaliação do ensino
médio e ferramenta de seleção para a universidade. Essa dicotomia acaba fazendo
com que ele não cumpra bem nem uma função, nem a outra. O Consed vem defendendo
que se discuta o Enem para repensar qual o seu papel como avaliação: se vai
selecionar para a universidade ou avaliar o ensino.
Membro da Academia Brasileira de
Educação, Antônio Freitas admite que utilizar o Enem como principal ferramenta
de seleção pode contribuir negativamente para o ensino médio, que passa a visar
somente a aprovação no vestibular. Mas ele defende que, por outro lado, essa
característica também foi responsável por democratizar o acesso ao ensino
superior no país:
— O formato atual naturalmente
influencia a preparação. Se alguém vai fazer um concurso para Polícia Federal,
essa pessoa vai estudar o programa da Polícia Federal. Assim acontece com o
Enem, que hoje é muito direcionado para o processo seletivo nas universidades.
No entanto, em comparação com o vestibular tradicional ele é muito superior —
acredita.
Segundo ele, o Enem saiu do desenho
inicial para se prestar a uma finalidade extremamente importante de seleção
nacional.
— Antes, não era incomum ter cerca de
10% de vagas ociosas nas universidades. Hoje, o aluno busca vagas
nacionalmente, não olha só para Rio e São Paulo, como antigamente. O Enem mudou
para melhor ou para pior? Mudou para algo diferente — analisa.
PRÓXIMO DO DIA A DIA
DOS CANDIDATOS
Na opinião de Cleuza Repulho, pedagoga
e representante do Movimento pela Base Nacional Comum Curricular, o Enem, assim
como todas as avaliações, é passível de transformações, e defende que a prova
caminhe na direção de aproximar o conteúdo ao cotidiano dos candidatos.
— Sempre temos para onde andar. Desde
sua concepção até hoje, o Enem foi evoluindo e se ajustando às condições. Hoje
o Enem é menos conteudista que outros vestibulares, mas ainda mantém a
importância e o peso dos conteúdos. A grande mudança só virá quando tivermos
uma Base Nacional Comum, porque ajustaremos a avaliação a ela, e atualmente os
ajustes são feitos com base no que a gente gostaria que ela fosse — comenta
Cleuza. — Perto do que tínhamos como modelo de vestibular, o Enem foi um passo
à frente e precisa continuar evoluindo. Precisamos ampliar as competências
avaliadas e aproximá-lo da vida real, daquilo que é importante as pessoas
aprenderem.
Em uma educação pontuada por
contrastes, o Enem, quando comparado com escolas brasileiras, parece estar
adiante. Para a educadora Andrea Ramal, o conteúdo da prova e a maneira como é
apresentado aos candidatos, com necessidade de raciocínio lógico e intimidade
com a leitura, é mais avançado que o modelo de ensino na maior parte das instituições
do país.
— Comparado com o que acontece na
maioria das escolas de ensino médio, a prova do Enem ainda está mais avançada
pedagogicamente falando porque é interdisciplinar, tem questões
contextualizadas. Não são exercícios que caem de paraquedas e o aluno não
entende para o que serve. Ajuda a medir não só o conteúdo, mas a capacidade de
interpretação e análise crítica do estudante — defende Andrea Ramal. — Poderia
ser uma prova melhor mas, perto do que acontece nas escolas, é mais avançada. O
Enem é como uma provocação para que as escolas repensem seu ensino.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/enem-chega-aos-18-anos-sob-criticas-elogios-prestes-mudar-de-formato-20057881#ixzz4OrLvGyi6
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