Todos os anos, quando se aproxima o Natal, a imprensa se encarrega de anunciar que diversos detentos poderão passar as festas de final de ano fora do presídio, em razão do "indulto de Natal" a eles concedido.
Quem é detentor do conhecimento técnico-jurídico não pode
incidir no equívoco cometido pelas denominações confusas que aparecem nos
noticiários. Operadores do Direito devem se atentar às grandes diferenças que
existem nestas saídas temporárias dos detentos, seja no final do ano ou não.
Desta feita tem-se, de um lado, o indulto natalino, que
se trata de um verdadeiro perdão aos condenados por determinados crimes,
ensejando a extinção de suas penas. O preso sai do estabelecimento prisional
para nunca mais voltar, porque extinta está sua pena. Tornou-se tradição o
chefe do Executivo Federal conceder indulto coletivo em épocas natalinas,
conforme permitido no artigo 84, XII da Constituição Federal.
Verifica-se, portanto, tratar-se de evidente instrumento
de política criminal, em que o presidente da República pode determinar que
certos crimes cometidos possam ser perdoados e todos os que por eles respondam
tenham suas penas extintas. É de se destacar que, uma vez expedido o decreto
presidencial de indulto natalino, os juízes das varas das execuções penais são
obrigados a acatá-lo.
Apenas
a título de exemplo, cita-se o decreto 7.873, de 26 de dezembro de 2012,
editado pela presidente Dilma Roussef, concedendo indulto natalino a pessoa:
Art. 1º, I: condenadas a pena privativa de liberdade não superior a oito anos,
não substituída por restritivas de direitos ou multa, e não beneficiadas com a
suspensão condicional da pena que, até 25 de dezembro de 2012, tenham cumprido
um terço da pena, se não reincidentes, ou metade, se reincidentes.
Este decreto traz ainda outras previsões e, todos os
condenados que nelas se encaixarem, terão suas penas perdoadas - portanto,
extintas - não tendo mais nada a cumprir na Justiça penal.
Por outro lado, a lei 7.210/84 (lei de Execuções Penais –
LEP), em seus artigos 122 e seguintes, prevê o instituto da saída temporária,
que em nada se confunde com o indulto natalino:
Art.
122. Os condenados que cumprem pena em regime semi-aberto poderão obter
autorização para saída temporária do estabelecimento, sem vigilância direta,
nos seguintes casos:
I
- visita à família;
II
- freqüência a curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução do 2º
grau ou superior, na Comarca do Juízo da Execução;
III
- participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social.
Parágrafo
único. A ausência de vigilância direta não impede a utilização de equipamento
de monitoração eletrônica pelo condenado, quando assim determinar o juiz da
execução.
Não bastasse, para sua concessão, o artigo 123, LEP, exige
o cumprimento de três requisitos cumulativos: (i) comportamento adequado; (ii)
cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena, se o condenado for primário, e
1/4 (um quarto), se reincidente; (iii) compatibilidade do benefício com os
objetivos da pena.
Insta consignar, portanto, que esta saída temporária pode
se dar em qualquer época do ano, até porque sua concessão não pode exceder
prazo superior a sete dias, com direito à renovação por mais quatro vezes
durante o ano (art. 124, LEP).
Logo, nestes casos, o condenado recluso pode sair, porém
deve retornar ao presídio no qual cumpre sua pena. Evidentemente, não se trata
de perdão, tampouco extinção da pena: verifica-se apenas a possibilidade de
autorização do condenado (não pode ser regime fechado) de sair temporariamente
do presídio para casos específicos, conforme artigo supra citado.
Sendo assim, evidencia-se o motivo da confusão realizada
entre os institutos ora referidos. É bastante comum que os condenados que
cumpriram os requisitos da LEP solicitem ao juiz da vara das Execuções Penais a
saída temporária na época de Natal, na Páscoa, Dia das Mães. Uma vez concedida,
terá prazo determinado, sendo que, caso os condenados não regressem ao
estabelecimento prisional, cometerão falta grave (artigo 50, II, LEP).
Destarte, é comum também que, na época do Natal, o Presidente da República
conceda o indulto natalino: é o suficiente para ensejar confusão.
Sendo assim, vislumbra-se o enraizamento de uma cultura
popular, denominando a saída temporária em época de Natal de indulto natalino.
Mas, conforme já exposto, não se pode confundir estes institutos, já que, em
suma:
O indulto de Natal é concedido pelo presidente da
República e a saída temporária, pelo juiz da vara das execuções;
O indulto de Natal é coletivo, enquanto que a saída
temporária é concedida de forma individual;
O indulto de Natal extingue a pena, já que se trata de
verdadeiro perdão. A saída temporária, se cumprida fielmente, em nada afeta a
pena; se descumprida, pode, eventualmente, fazer com que o condenado regrida de
regime.
COLUNISTA RENATA SOUZA
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