Art. 213 do Código Penal - Decreto Lei 2848/40
CP - Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou
grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se
pratique outro ato libidinoso: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
(Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
§
1o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou
se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: (Incluído
pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze)
anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§
2o Se da conduta resulta morte: (Incluído pela Lei nº
12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta)
anos (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Atentado violento ao pudor (Revogado pela Lei
nº 12.015, de 2009)
O estupro coletivo de uma adolescente de 16 anos no Rio de Janeiro foi
o principal assunto de várias manchetes brasileiras. Não só o corpo da vítima
foi violado por 33 homens como imagens do ato foram registradas e divulgadas
nas redes sociais pelos próprios criminosos.
Em
entrevista ao Fantástico, a jovem conta que após todas
as agressões sofreu ainda uma série de humilhações: ela foi culpabilizada
por muitos — inclusive o delegado designado para cuidar de seu caso — pelo que
lhe aconteceu, além de ter recebido milhares de críticas e ameaças de
morte vindas de pessoas
do país inteiro. É por conta desse tipo de reação que grande parte das vítimas não denuncia os
estupros e outros tipos de violência que sofre. E não são poucas: a cada uma hora e meia, uma mulher morre
no Brasil por causas relacionadas à violência, em sua maioria, cometidas
por homens, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
Mas por que quando um estupro acontece, a primeira coisa que se passa pela cabeça das pessoas é se questionar se a vítima está falando mesmo a verdade? Certamente não é o que ocorre com outros crimes, a não ser que você duvide toda vez que alguém afirma ter sido vítima de um assalto ou roubo. A resposta é simples: por conta da cultura do estupro, que é muito enraizada na nossa sociedade. Uma série de mitos sobre o estupro e a cultura que o perpetua são disseminados diariamente. Você provavelmente já contribuiu para isso ocorrer, mesmo sem querer. Por isso GALILEU consultou pesquisas, relatos e conversou com especialistas para explicar o que é esse infeliz fenômeno, como eles afeta a sociedade e, o mais importante, como podemos melhorar. Confira abaixo:
Mas por que quando um estupro acontece, a primeira coisa que se passa pela cabeça das pessoas é se questionar se a vítima está falando mesmo a verdade? Certamente não é o que ocorre com outros crimes, a não ser que você duvide toda vez que alguém afirma ter sido vítima de um assalto ou roubo. A resposta é simples: por conta da cultura do estupro, que é muito enraizada na nossa sociedade. Uma série de mitos sobre o estupro e a cultura que o perpetua são disseminados diariamente. Você provavelmente já contribuiu para isso ocorrer, mesmo sem querer. Por isso GALILEU consultou pesquisas, relatos e conversou com especialistas para explicar o que é esse infeliz fenômeno, como eles afeta a sociedade e, o mais importante, como podemos melhorar. Confira abaixo:
1 - O que é a cultura do estupro?
O termo foi cunhado na década de 70 por feministas
americanas e, de acordo com o Centro das Mulheres da Universidade
Marshall, nos Estados Unidos, é
utilizado para descrever um ambiente no qual o estupro é predominante e no qual
a violência sexual contra as mulheres é normalizada na mídia e na cultura
popular. Ao disseminar termos que denigrem as mulheres, permitir a objetificação
do corpos delas e glamurizar a violência sexual, a cultura do estupro passa
adiante a mensagem de que a mulher não é um ser humano, e sim uma
coisa. "Vivemos em uma
sociedade patriarcal que considera que nós mulheres somos ou sujeitos de
segunda categoria, ou em alguns casos, que não somos sujeitos e podemos
ser utilizadas ou destruídas", explica Izabel Solyszko, que é professora,
assistente social e doutoranda em Serviço Social na Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ). Quando uma família dá boas-vindas a um bebê, o recém-nascido
vem com várias expectativas: se
for menino, espera-se que ele seja agressivo; se for menina, espera-se que seja
delicada. São scripts pré-determinados para cada gênero. "O
conceito de gênero surge para questionar a ideia de uma essência ou natureza
que explique os comportamentos", diz a pesquisadora Jane Felipe de Souza,
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). "É essa necessidade
de se pautar em aspectos biológicos para justificar diferenças, as colocando
como desigualdade, inferioridade, que o conceito de gênero procura
combater."Como aponta Arielle Sagrillo, doutoranda em psicologia forense
na Universidade de Kent, na Inglaterra, a sociedade cria expectativas muito
grandes para ambos os gêneros. "Não permitimos que as crianças e adultos
transitem entre esses espaços. Desde
cedo dizemos a esses sujeitos o que eles devem ser, antes mesmo que possam
descobrir o que querem, o que lhes afeta e como lidam com suas próprias emoções",
afirma. Dentro das expectativas, observa a advogada americana Reshma Saujani, os
meninos são criados para serem corajosos e se arriscarem, enquanto as meninas
são criadas para buscarem a delicadeza e a perfeição. Da mesma
forma, espera-se que eles sejam mais agressivos ("Homem de verdade não
chora", não é mesmo?) e que elas se sintam responsáveis — pela casa, pelos
filhos, pelo companheiro e até mesmo pelas violências que sofrem.
"Os
homens são ensinados a usarem a agressividade de maneira violenta, desde a
infância são estimuladas a vivenciarem sua sexualidade até um ponto de serem
reconhecidos como pessoas que 'precisam de sexo', 'que perdem a cabeça
por sexo', que se tornam praticamente 'irracionais' quando o assunto é
sexo", explica Solyszko. "Isso faz com que as pessoas pensem que
o estupro é uma questão de sexo e sexualidade quando o estupro é uma questão de
violência porque se trata de uma agressão bárbara e brutal que invade o corpo
de outra pessoa."
2 - Existem vários mecanismos que propagam a cultura do estupro
Pense nos comerciais aos quais você assistiu
recentemente. Agora se concentre naqueles que possuem presença feminina. Reflita ainda mais: em quantos deles as
mulheres aparecem como um simples corpo para agradar os homens? Quantos
deles contam com piadas relacionadas às aparências delas?
Tal representação é chamada de objetificação. Um
estudo realizado pela Associação Americana de Psicologia explica que "muitas mulheres são objetificadas
sexualmente e tratadas como objetos para serem valorizadas por seu uso",
o que só reforça a ideia de que a mulher é uma coisa, e não um ser humano.
Segundo Solyszko, além de ser patriarcal, a sociedade em que vivemos é racista
e capitalista. "Essas três dimensões de dominação e de opressão vão
permitir que as vidas e os corpos das mulheres sejam explorados,
mercantilizados, coisificados e, inclusive, agredidos, mutilados, estuprados e
assassinados."
3 - Você também contribui com a cultura do estupro
E não precisa ser um estuprador para que isso
aconteça. Ao consumir músicas que denigrem a mulher e disseminar vídeos,
imagens, comentários e piadas sexistas, por exemplo, você contribui para que a
objetificação da mulher seja reforçada. "Nessa cultura machista que só pode se sustentar pela existência de uma
sociedade patriarcal, são diversos os mecanismos que vão das piadas que nos
desqualificam para dirigir, para ser engenheiras, para ser presidente do país
até a violência sexual no transporte público e nas ruas",
pondera Izabel Solyszko. Vale ressaltar que a violência contra a mulher
não se restringe ao estupro. Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Avon
em parceria com o Data Popular, podem ser consideradas formas de assédio
cantadas ofensivas ou com apelo sexual indesejado; coerção; a violência física;
a desqualificação intelectual e a violência sexual, que vai desde o toque sem
consentimento até o estupro. Dados do Think Olga mostram que 48% dos assédios
são verbais e 68% deles ocorrem durante o dia.
4 - A vítima nunca é a culpada
Como reforça Izabel Solyszko,
"independentemente do nosso comportamento e da nossa aparência, nada,
absolutamente nada (nem que eu seja garota de programa, nem que eu seja
promíscua, nem que eu esteja bêbada, nem que eu esteja sozinha com vários
homens em um quarto), realmente nada vai justificar uma violência contra
mim".No livro Missoula, de Jon Krakauer, a promotora Suzy
Boylan pondera que o estupro é o único crime em que presume que a vítima esteja
mentindo. "Se uma pessoa é
assaltada num beco, ficaríamos céticos com o depoimento da vítima só porque não
havia testemunha ocular? Nós iríamos duvidar da vítima de um roubo
porque ela deixou a porta de casa destrancada?", questiona. O
silenciamento e a culpabilização das vítimas são alguns dos principais
artifícios da cultura do estupro. "Se
o sigilo falha, o agressor ataca a credibilidade de sua vítima. Se não consegue
silenciá-la totalmente, ele tenta se certificar de que ninguém lhe dê
ouvidos. Para tanto, convoca um impressionante esquadrão de
argumentos, da negação mais descarada à racionalização mais sofisticada e
elegante", explica Judith Lewis Herman em "Trauma and Recovery".
"Depois de cada atrocidade, podem-se esperar ouvir as mesmas desculpas
previsíveis: jamais aconteceu; a vítima mente; a vítima exagera; a vítima que
provocou isso; e em todos os casos é o momento de esquecer o passado e seguir
em frente."
O problema é que a cultura do estupro está tão enraizada na
sociedade em que vivemos que não é só o agressor que apresenta tal
comportamento: profissionais da saúde e da
lei também o reproduzem. No relato que deu ao Fantástico, a
vítima do estupro coletivo no Rio de Janeiro contou que foi interrogada por
vários homens que expuseram imagens do crime para ela, além de realizarem
questionamentos absurdos como se já tinha feito sexo grupal. "É fácil
esquecer que o dano causado a uma vítima de estupro que é desacreditada pode
ser no mínimo tão devastador quanto o dano causado a um homem inocente que é
injustamente acusado de estupro", aponta Jon Krakauer em Missoula.
"E, sem dúvida, o segundo caso acontece com muito mais frequência."
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