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A Lei e a Internação Compulsória

quinta-feira, 20 de outubro de 2016



A lei e a internação compulsória
Muitos pedidos de internação compulsória apresentados ao Judiciário, nos últimos meses, quase sempre em razão da dependência do crack, têm se mostrado desnecessários. Outro equívoco que se percebe é a acumulação dos pedidos de internação com a interdição por incapacidade, quando há familiar para assumir a curatela e pedir a internação. A questão da internação do paciente acometido de transtorno mental é regida pela Lei 10.216/2001, que representou um março no processo de valorização da vontade do paciente, mesmo tendo reconhecido que, momentaneamente, a expressão da vontade pode não ser possível. Prevê o parágrafo único do artigo 6º da mencionada Lei que há três tipos de internação psiquiátrica: 1)-voluntária, solicitada pelo paciente; 2)- involuntária, pedida por terceiro; e 3)-compulsória, “aquela determinada pela Justiça”. Obviamente, a necessidade de internação, em qualquer modalidade, será sempre avaliada por médico. A lei citada acima afirma que a internação involuntária pode ser pedida por “terceiro”. Penso que as pessoas habilitadas a formularem o requerimento são, por analogia, as mesmas previstas no Art. 1.768 do CC, a saber: pais ou tutores, cônjuge (ou companheiro), ou por qualquer parente. Sem adentrar na questão de haver ou não um problema epidêmico relativo ao uso do crack, o certo é que para que haja a internação involuntária, basta que um familiar formule o requerimento na unidade hospitalar e que o médico a autorize (Art.  da Lei 10.216/2001).
Quando o pedido de internação for feito por terceiro, entendido como tal o familiar, o requerimento deve ser administrativo e apresentado diretamente no estabelecimento de internação, ou no centro de regulação, no caso do Sistema Único de Saúde (SUS). Não há necessidade de intervenção Judicial ou do Ministério Público para que haja a internação involuntária. Apenas é preciso que o estabelecimento hospitalar comunique ao Ministério Público, em 72 horas, na forma da referida lei.
A internação compulsória está prevista na lei para aplicação naquelas situações em que há necessidade de intervenção estatal (questão de saúde pública), mas não há solicitação de familiar para a internação. Nestes casos, tanto o Ministério Público quanto o setor próprio da área de saúde pública podem formular ao Judiciário o pedido de internação compulsória do paciente.
O pedido de internação compulsória deve ser direcionado ao Juiz da Vara de Família, pois o fundamento do pedido é o fato de o usuário de substância entorpecente estar impossibilitado, momentaneamente, de decidir acerca do próprio interesse, no caso sua saúde. De qualquer forma, a medida, deferida em caráter emergencial e temporária, deve preceder de manifestação do Ministério Público e será sempre deferida no intuito de proteger o interesse do usuário. O magistrado jamais deve fixar o tempo da internação, pois caberá ao especialista responsável pelo tratamento decidir sobre o término da internação (§ 2º do Art. 8º).
A internação (involuntária ou compulsória) deve ser mais breve possível, pois, o quanto antes, o paciente deve ser formalmente cientificado dos direitos previstos no parágrafo único do Art.  da Lei 10.216/2001, mormente o direito previsto no inciso V: “ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária.”
A internação (involuntária ou compulsória) não deve estar atrelada à interdição, pois esta é medida muito mais drástica que a internação. Somente se cuida de interdição quando constatado que o tratamento foi ineficaz e que a dependência química resultou em incapacidade para os atos da vida civil. Aliás, prevê o artigo , II do CC, que os viciados em tóxicos são “incapazes relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer”. Logo, em caso de declaração da incapacidade devido à dependência química, a sentença deve especificar os limites da incapacidade.
Muitos pedidos de internação, visam, na verdade, a entrada dos pacientes em estabelecimentos hospitalares, por força de ordem judicial, sem observância à regulação do SUS. De fato, em vários Estados da Federação a falta de vagas no Sistema Único de Saúde é problema que agrava ainda mais a situação do usuário de substâncias entorpecentes.
Contudo, o problema não pode ser enfrentado com pedido judicial de internação compulsória, que visa quase sempre desrespeitar a regulação do SUS. É necessário tomar cuidado para não se desvirtuar o foco de enfrentamento do problema.
Pode-se argumentar que a intervenção judicial se faz necessária para o uso de força quando o paciente resistir à internação. Contudo, uma vez autorizada a internação (involuntária ou compulsória), cabe ao SUS providenciar a entrada do paciente no hospital, o que, por certo, deve ser feito com atuação dos agentes do SAMU. Tais providências são de saúde pública e não exigem atuação do Poder Judiciário.
O Ministério Público pode buscar o enfrentamento do problema público relativo à falta de vagas e regulamentação de ações no SUS, por meio de ajustamento de condutas ou proposituras de ações para obrigar o poder público (SUS) a regulamentar a internação e a oferta das vagas necessárias. O tema é polêmico por entrar na esfera de deliberação administrativa do executivo, questão esta que não vou aqui tratar. Se a medida judicial busca tratar da obrigação estatal de fornecer tratamento médico, a causa de pedir é outra e, neste caso, a competência para julgamento é do juízo das fazendas públicas, estadual, municipal, ou mesmo da Justiça Federal, dependendo da situação.
A falta de informação acerca das disposições previstas nas normas pode estar dificultando o enfrentamento do problema, até mesmo porque são muitas as Portarias do Ministério da Saúde a cuidar do tema, gerando um verdadeiro emaranhado. Deste modo, acredito que se faz necessário, e mais que urgente, o lançamento de uma cartilha explicativa, tratando, dentre outros, dos seguintes pontos: locais onde se deve buscar tratamento (capital e interior), pessoas habilitadas a fazê-lo, tipos de internação, procedimento a ser adotado pela instituição hospitalar quando das internações, direitos dos pacientes e familiares, pois além dos direitos aqui mencionados há vários outros descritos na Portaria 3.088/2011 do Ministério da Saúde, a qual faz referência a todas as normas relativas ao enfrentamento do transtorno mental por uso de substância entorpecente.

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra.
Art. 2o Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:
I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades;
II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;
III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;
IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas;
V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária;
VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;
VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento;
VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;
IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Art. 3o É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.
Art. 4o A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.
§ 1o O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente em seu meio.
§ 2o O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros.
§ 3o É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em instituições com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos recursos mencionados no § 2o e que não assegurem aos pacientes os direitos enumerados no parágrafo único do art. 2o.
Art. 5o O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária competente e supervisão de instância a ser definida pelo Poder Executivo, assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário.
Art. 6o A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos.
Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica:
I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;
II - internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e
III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça.
Art. 7o A pessoa que solicita voluntariamente sua internação, ou que a consente, deve assinar, no momento da admissão, uma declaração de que optou por esse regime de tratamento.
Parágrafo único. O término da internação voluntária dar-se-á por solicitação escrita do paciente ou por determinação do médico assistente.
Art. 8o A internação voluntária ou involuntária somente será autorizada por médico devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina - CRM do Estado onde se localize o estabelecimento.
§ 1o A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas horas, ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser adotado quando da respectiva alta.
§ 2o O término da internação involuntária dar-se-á por solicitação escrita do familiar, ou responsável legal, ou quando estabelecido pelo especialista responsável pelo tratamento.
Art. 9o A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação vigente, pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e funcionários.
Art. 10. Evasão, transferência, acidente, intercorrência clínica grave e falecimento serão comunicados pela direção do estabelecimento de saúde mental aos familiares, ou ao representante legal do paciente, bem como à autoridade sanitária responsável, no prazo máximo de vinte e quatro horas da data da ocorrência.
Art. 11. Pesquisas científicas para fins diagnósticos ou terapêuticos não poderão ser realizadas sem o consentimento expresso do paciente, ou de seu representante legal, e sem a devida comunicação aos conselhos profissionais competentes e ao Conselho Nacional de Saúde.
Art. 12. O Conselho Nacional de Saúde, no âmbito de sua atuação, criará comissão nacional para acompanhar a implementação desta Lei.
Art. 13. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 6 de abril de 2001; 180o da Independência e 113o da República.

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